Ao nos relacionarmos com as crianças, somos convocados a uma entrega de tempo, presença e inteireza.
Paulo Fochi fala que um dos ingredientes do seu olhar é:
“Olhar como uma criança explora as coisas do mundo: interessada, atenta, curiosa, dionisíaca. Um olhar que já é conhecimento, que carrega todos os ingredientes de um grande cientista e de um grande artista. Olhar profundo, vagaroso, minucioso, perspicaz.”
A educação infantil é um enorme convite a olhar e pensar, ampliar, desenvolver esse olhar. Considerando nosso cenário educacional e nossa história enquanto nação, entendemos as limitações que nos cercam e ainda sentimos o reflexo do tipo de educação a que fomos expostos.
Como uma escola sociointeracionista, temos o privilégio de vivenciar em nosso cotidiano esse convite ao olhar atencioso.
Pensar a educação infantil com foco na primeiríssima infância tem sido uma experiência enriquecedora, que me permite enxergar a potência que os bebês carregam em si. Observar e acompanhar seu dia a dia é inspirador, e me revelou que nossa jornada de aprendizagem segue em paralelo: enquanto acompanhamos o desenvolvimento dos pequenos, também crescemos como educadores e como seres humanos.
Quando olhamos para teóricos como Wallon, Mallaguzzi e Pikler, dentre outros, compreendemos que o desenvolvimento integral nessa etapa vai ocorrer de forma orgânica se proporcionarmos a imersão dos bebês em espaços ou ambientes cheios de afeto e com adultos que acreditam no potencial dessa infância.
Enquanto fazia essa reflexão, senti um pulsar por compartilhar um recorte de uma experiência que vivenciei enquanto observava um momento no berçário.
Certa tarde, durante uma visita à sala dos bebês, cenas instigantes começaram a se desenrolar. Ao chegar à porta, percebi como a atenção dos pequenos estava aguçada. Um bebê de nove meses, com quem eu já havia construído uma relação de confiança, aproximou-se rapidamente, como se estivesse esperando o habitual passeio. Enquanto isso, outro bebê, também de nove meses, com quem eu ainda estava desenvolvendo uma conexão, buscou a professora, sua principal referência de acolhimento, e permaneceu observando à distância.
Ainda na porta, conversava explicando que, naquele momento, não faríamos o passeio, mas que eu entraria para brincarmos um pouco. Ao entrar, ofereci colo para o bebê que estava de pé no portão. Nos sentamos e, depois de um momento de aconchego, ele voltou a explorar os brinquedos que estavam no tapete. Sua atenção se dividia entre os elementos que chamavam sua curiosidade e a minha presença na sala. Após um tempo, outro bebê também se sentiu à vontade para se aproximar, buscando o brinquedo que eu segurava. Foi ali que nossa conexão começou a se formar.
Em determinado momento da tarde, quando minha presença já não era mais uma novidade, observei os bebês engatinhando e explorando o mundo ao seu redor. Um deles, ao escalar um triângulo — um brinquedo desafiador para eles — demonstrava grande foco e determinação. A cada vez que seu pé escorregava, ele olhava rapidamente para as professoras, que estavam sentadas ali, acompanhando de perto. Era como se buscasse apoio. Ao encontrar os olhares expressivos e confiantes delas, retomava suas tentativas quase automaticamente, pronto para enfrentar novos desafios. Naquela tarde, chegou até o segundo degrau do brinquedo, vencendo aquele desafio e descobrindo um pouco mais do potencial do seu corpo.
É nesse espaço que confiamos estar o desenvolvimento integral da infância. Esse é apenas um pequeno recorte, carregado das ricas experiências vivenciadas pelas crianças. Somente ao desenvolvermos nosso potencial de observação, podemos construir esse ambiente para elas.
Pausar para observar é, de fato, desafiador, pois nos tira do lugar de "fazer", mas, ao conseguirmos, percebemos quantas belezas e encantamentos se revelam aos olhos atentos. Como dizem Anna Tardos e Agnès Szanto Feder:
“As crianças não brincam, elas vivem!”
Por isso, estamos constantemente refletindo sobre nossa prática, aprendendo a cada passo.
Edilaine Carvalho
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